sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Lauro de Freitas: Vendedora denuncia ter sido espancada por policiais após filhos serem maltratados na casa do ex-marido PM

 

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Vítimas fizeram exame de corpo de delito na Deam — Foto: Arquivo Pessoal

Uma promotora de vendas, de 37 anos, denunciou ter sido espancada por policiais militares na frente da 52ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM), em Lauro de Freitas, cidade que fica na região metropolitana de Salvador. Conforme Michele Borges, a mãe dela e a irmã também foram agredidas com socos, pontapés e tapas.

O caso aconteceu na tarde de domingo (6). Michele Borges conta que foi casada por sete anos com o soldado Anderson Oliveira de Sá, 40, que trabalha na 52ª CIPM. Eles estão separados há cerca de três anos.

Promotora de vendas denuncia ter sido espancada por policiais após filhos serem maltratados na casa do ex-marido PM — Foto: Arquivo Pessoal

Ao G1, a promotora de vendas contou que foi até o local junto a mãe, a irmã e o cunhado, procurar ajuda do comandante da corporação, após os três filhos dela com o ex-marido, uma menina de 9 anos e um casal de gêmeos de 7, serem deixados na porta da casa da avó, sozinhos e machucados. As crianças passaram a última semana com o pai.

“Um vizinho ligou para minha mãe dizendo que meus filhos estavam sozinhos na porta de casa. Quando minha mãe chegou, eles estavam nervosos, choravam muito e contaram que apanharam na casa do pai”, disse.

A mãe de Michele Borges gravou um áudio das reclamações das crianças e enviou por uma aplicativo de mensagens para ela.

“Hoje eu moro com meu companheiro, e meus filhos com minha mãe, porque ele [soldado Anderson Oliveira] não quer que as crianças tenham contato com meu namorado”, disse Michele Borges.

“Minha mãe me ligou falando: ‘Escute esse absurdo, as crianças estão dizendo que apanharam na casa do pai. Vamos lá no batalhão procurar ajuda’. Aí eu falei: ‘Vamos, te encontro na porta do batalhão'”, relatou.

O G1 teve acesso aos áudios enviados pela vó das crianças para a mãe. Neles, os três filhos do policial imploram para que a vendedora não deixe eles voltarem para a casa do pai.

Agressões

Michele Borges contou que aceitou o conselho da mãe porque acreditava que o ex-marido estava de folga no domingo. Entretanto, a primeira pessoa que ela encontrou na guarita da CIPM foi o soldado Anderson Oliveira, que a recebeu com xingamentos e ameaças.

“Ele já chegou falando: ‘O que é que você quer aqui? Saia daqui se não eu te dou um monte de tiros’. Quando ele fez essa ameaça, eu gritei: ‘Ei, ei, por favor, eu posso falar com o superior de Oliveira Sá?”, contou.

Vítimas fizeram exame de corpo de delito — Foto: Arquivo Pessoal

“Desceram alguns policiais e um deles questionou: ‘Quem aí é a mulher de Oliveira Sá?’ Aí eu disse que eu era a mãe dos filhos dele e já recebi o primeiro tapa no rosto. Aí ele me falou: ‘Você estava onde, sua vagabunda, que o cara chegou atrasado para trabalhar?”.
A promotora de vendas informou que questionou ao policial se o atraso no trabalho justificava que o soldado “abandonasse” os filhos na rua.

“Aí eu já fui recebendo um soco nos peitos. Falei: ‘Gente, filma isso, pelo amor de Deus, porque eu vim pedir ajuda e estou recebendo porrada’. Eu comecei a gritar por socorro e pedi para as pessoas filmarem, porque tem umas casas vizinhas”, contou.

“O mesmo policial sacou a arma e falou: ‘ Cala a boca, porque se Oliveira Sá não tem coragem de lhe dá um monte de tiro, eu tenho. Deixe de presepada’. Foi essa hora que minha mãe e minha irmã vieram intervir ao meu favor. As crianças gritavam muito na rua”.
Segundo Michele Borges, foi nesse momento que pelo menos três policiais agrediram ela, a irmã de 34 anos, a mãe, que tem 54, e o cunhado com murros e chutes. A promotora de vendas e os familiares foram levados no camburão de uma viatura para a 23ª delegacia e foram atuados por desacato.

“Os meus filhos foram em uma outra viatura com o pai e o primeiro policial que me bateu. A minha filha me contou que o policial falou pra eles dizerem que era tudo mentira se não a mãe deles ia ficar presa”, revelou.

Por causa das agressões, as três mulheres ficaram hematomas no rosto, nas costas e na barriga. A irmã de Michele Borges, que tem esquizofrenia, chegou a ficar internada no Hospital Português, por causa de ferimentos no rosto.

Medida Protetiva

Vítimas tiveram escoriações após agressões — Foto: Arquivo Pessoal

A vítima contou que o relacionamento com o policial terminou há três anos e que eles não tinham costume de brigar quando casados.

“Ele decidiu sair de casa e eu não tive muita escolha. Sempre respeitei a decisão dele, fiquei com os meus filhos e ele formou uma nova família. Há mais ou menos dois anos, eu arranjei um namorado e começou o inferno”.

De acordo com Michele Borges, as ameaças ficaram mais frequentes até que ela tomou coragem e procurou a Justiça. Uma medida protetiva foi expedida em maio de 2019.

“Ele descobriu a casa onde eu estou morando com o meu novo namorado, tirou foto do portão da casa e mandou para ele. Ele [ex-marido] mandou uma mensagem perguntando se ele conhecia esse portão e disse que se já sabia onde era a fazenda do meu namorado, o aras, a casa, que era para me largar logo”, relatou Michele.

Decepção com a corporação
Depois do ocorrido no último domingo, a promotora de vendas recebeu uma ligação do comandante de Oliveira Sá e voltou à sede da CIPM para ser ouvida.

“Ele perguntou como eu estava, disse que era para eu não colocar a mídia nessa história, porque as coisas iam ser resolvidas e eles [os policiais] iam ser punidos. Mas eu não quero deixar isso passar assim, minha mãe e minha irmã também foram agredidas, nós fomos autuadas por desacato. No quartel tem câmeras, nas viaturas também, com certeza foi gravado”, disse.

Michele Borges também procurou a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), onde registrou o caso e recebeu guia para exame de corpo de delito. As agressões também foram registradas na Corregedoria da Polícia Militar.

“Eu estou muito decepcionada com a corporação. Eu sou filha de policial militar, estudei em Colégio Militar, sei dos ensinamentos que a instituição prega e o que foi feito comigo, com minha mãe, com minha irmã foi um absurdo. Não foi essa educação que eu recebi na escola e que eles deveriam ter”, disse.

O que diz a PM
Em nota, a Polícia Militar informou que a Corregedoria Geral da corporação vai instaurar um feito investigatório para apurar as denúncias contra os referidos policiais militares.

Segundo a PM, na última segunda-feira (7), a denunciante esteve na sede da 52ª CIPM, juntamente com os familiares, e foi recebida pelo comandante da unidade onde os militares são lotados. Ela formalizou as denúncias e de imediato todos foram ouvidos.

Como medida preventiva, de acordo com a Polícia Militar, durante o processo apuratório, o comandante da 52ª CIPM afastou os policiais militares denunciados das atividades operacionais.

A PM informou que toda a documentação foi remetida para a Corregedoria Geral, que apura o fato.

(G1/BA)